Mocidade
Ficha Técnica 2024
- Enredo: “Pede caju que dou… pé de caju que dá!”
- Carnavalesco: Marcus Ferreira
- Presidente: Flávio da Silva Santos
- Vice-presidente: Luiz Claudio Ribeiro
- Presidente de Honra: Rogério Andrade
- Diretores de Harmonia: Wallace Capoeira
- Intérprete: Zé Paulo Sierra
- Mestre de Bateria: Dudu Oliveira
- Rainha de Bateria: Giovana Angélica
- Mestre-Sala e Porta-Bandeira: Diogo Jesus e Bruna Santos
- Comissão de Frente: Paulo Pinna
“Pede caju que dou… pé de caju que dá!”
G.R.E.S. MOCIDADE IDEPENDENTE DE PADRE MIGUEL | Carnaval 2024
Sinopse – RESUMO
Carne de caju
O poeta sempre mira a própria terra ao trançar letras e alçar voos. Nada mais natural que ele e seus parceiros, além de outras inspirações, buscassem uma fruta nativa, farta e com certo capricho corporal para explodir em cores toda a revolução tropicalista. Pudera! A suculência agridoce que seduz os lábios, proclama a ciência, é mero penduricalho acessório. O fruto, no duro, está no alto, qual um cocar, black power ou coroa: a castanha. Mas quem é bobo de não se lambuzar com tudo?
No chão de inversões igualmente marcantes e da arte que passou a transgredir e realçar o profundo da brasilidade, nosso recado carnavalizado tá na mesa: o redemoinho antropofágico da Tropicália cravou os dentes também em carne de caju. Yes, nós temos pra chuchu! A partir dele, simbora abocanhar e sentir o país de tantas porções e sabores? Caldo de mel e travo, como o cotidiano, “a manhã tropical se inicia. Resplendente, cadente, fagueira, num calor girassol com alegria. Na geleia geral brasileira que o Jornal do Brasil anuncia…”.
Há um cajueiro de copa verdinha no lado esquerdo de todos os peitos, dizem. Pinta de rim, mas convite ao pecado. Caju-de-árvore, caju-anão, caju-rasteiro, caju grandão ou tímido, caju amarelo, rosado ou pra lá de vermelho. Protagonista de soneto composto, quiçá, na banheira de Vinicius: “consistência de caralho e carrega um culhão na natureza”. O materialismo elementar pelo avesso. Que mancha, que arde, que abunda! Que chove. Exagerado e a prumo. Tupi acayu a pau.
Cajuí or not cajuí, that is the question! Faremos dele carnaval!Anacardium occidentale
E vamos de mergulho no passado contado em castanhas por tantos povos originários. Cada caju na cabaça, uma primavera. A tribo do indígena Porã, expulsa do lugar de origem, só encontrou felicidade quando floresceram as castanhas guardadas pelo sábio Tamandaré (seu avô), até então, perdidas. Veio a seguir o tempo de caju, de generosidade, já que a “noz que se produz”, além do beabá da Botânica, semeia fartura, lembrança e afeto. Nas cerimônias que envolvem o Torém, ritual sagrado dos Tremembés, os espíritos dos que cantaram para subir proseiam com os vivos. O entornar desbragado de mocororó, ou vinho de caju, hidrata a raiz das tradições – já que a festa esbarra na época de colheita.
Contam os sabidos que hordas do interior buscavam o litoral enfeitado pelas árvores abarrotadas. As ditas “Guerras do Caju” surgem assim, e antes de Cabral, mas ganharam adstringência quando as treze naus apontaram no horizonte. Aí, cresceu o olho gordo pra ordem de tonelada! O portuga logo melou os bigodões de interesse. O francês, mon amour, pôs na boca, manchou os bolsos e deu firma em célebre ilustração. Já ao dono real da terra… Bem, restou lutar – borduna em punho – contra as mumunhas do afanar institucionalizado, nosso amargor histórico.
E nem falamos do holandês, outro que não marcou bobeira naquele fuzuê: Nassau tratou de legislar, pôs carimbo e remeteu aos seus o presentinho inflacionado. Velas ao vento na contramão, estava arranjada a invasão – o caju-desbravador a fazer epopeia e pose de Tupiniquim Caju Fruit Company – pelo inverso itinerário das grandes navegações. Retorno à vista! The Brazilian Way Of Life natural reverenciado com rapapés e incrementado do lado de lá do oceano por monarcas e súditos.Caju-rei
Mas, se até o nada asseado D. João topava um banho de gato marotíssimo na antiga Praia do Caju (com a intenção de se curar das picadas por carrapatos), e Pedro II era retratado como Pedro Caju pelas charges dezenovistas… Quis o fruto erguer o seu reinado nas bandas de cá mesmo. Em Pirangi do Norte (quina litorânea superior do país), no ano da libertação dos escravos, um pescador de nome Luiz Inácio plantou o danado que vestiu a faixa de “Maior Cajueiro do Mundo”.No lugar de subir, a galhada se espichou para os lados, com a aparição de novas raízes ao tocar o solo. Danou a crescer sem freios. O “polvo” potiguar de tentáculos cheirosos fez fama e enumera colheitas a sumir da memória, espécie de refazenda em trajetória interminável. Sobre o pescador homônimo de presidente, seguiu os dias sempre próximo à criação improvável. Certa vez, bastante velhinho, sentou-se prum descanso à sombra de uma das ramificações e nunca mais acordou. Ciclo vital aromatizado pela árvore-sentinela.
Tudo parecia mar calmo, só que pintou contestação. O típico duelo de meninotes de calça curta acerca de quem ostenta o tronco de destaque entre a molecada. Recentemente, o autocoroado “Cajueiro-Rei”, nas franjas do Delta do Parnaíba, tratou de reivindicar o alto da rampa de campeão da fita métrica. No caso deste, há, ainda, trágica lenda indígena a tiracolo: espalham nos arredores que – cercados por mar de cavalos-marinhos, peixes-bois, tartarugas e golfinhos – dois guerreiros lutaram pelo amor da cunhã-poranga Jacira. Culminou em tragédia acompanhada de milagre.Após a disputa, o perdedor emboscou o seu rival e a amada durante passeio em que colhiam cajus. Duas flechadas, ambos mortos. Foi, então, que a tempestade plena de raios e trovões do dia seguinte produziu cena mágica: no exato lugar do enterro do casal, emergiu a planta de dimensão extraordinária. Alguém duvida?
O quiproquó dos cajueiros inspira torcidas organizadas, teorias rocambolescas que fazem biólogos rebolarem um bocado nas explicações, tal de “mede aqui, mede acolá” longe do apito final do juiz. Mas, enquanto não existe régua com o devido amém de ambos os lados, o jogo é bom para a castanha-commodity e seu pedúnculo popstar: seguem campeões de audiência junto a paladares gringos e nossos. Autênticos reis do mundo. Reis à caju.
Caju-brasuca
Entre pelejas e causos assim da sabedoria dos povos – com delírios por excesso de caju fermentado nas ideias ou verdades incontestes –, o filho legítimo dessa aldeia gigante grudou feito “noda”. Expressão de memória coletiva, nos lábios de mel da literatura, economia musculosa, holofote dos anjos ou demônios que nos conectam ao sentimento e calorzinho de nação. Castanha-mátria, caju-pátria. Confidentes dos profundos quintais interiores.
Nas curvas do destino e dos desatinos de Macunaíma, tão metáfora da rotina brasileira, ah!, lá está o caju a marcar e serpentear os seus passos contraditórios. Acompanhante-anti-herói-espelho-meu. Caju-brasuca também na corda bamba com pincel na mão: a feira modernista de Tarsila em contraste com a “cica” memorial da melancólica aquarela de Debret retratando a escravidão. Haja caju nas tantas camadas sobre tela! Telas, por óbvio, da mais pura vida real extraída do pé. Pede caju que dou, pé de caju que dá.Dá em tela de caju-caipi-pop, virado pra dentro industrialmente, enquanto as pernocas não bambeiam: a própria enciclopédia dos amigos pós-doutores na disciplina língua enrolada. Consistente, cortadinho em rodelas, do prato e da polpa, sabor agreste e cerrado, que encanta o doce e o salgado. Para quem quebra castanha coletivamente – alegoria da roda cronológica –, gosto de pertencimento compartilhado e laço. Ou mero pedaço, vá lá.
Tela do caju-família. Vitamina, crendice e mistura que nos inflamam. Do refresco, do licor, do suco. “Goiabada para sobremesa…”. O acorde da viola sussurrando saudades. E até compota ajeitadinha, fita e tudo. Remedinho da mamãe. Receita passada como herança no caderninho amarelado que não se empresta nem ao melhor amigo. Sujeito-elo entre a rua e a varanda. Toalha de mesa estendida e água na boca. Pinga. A regar brincadeira popular ou manifestação religiosa: da quermesse à curimba, do sambão ao batidão na esquina de casa.
Tela do caju-moleque. Com travessa de cajuzinhos a perfumar a vivência dos experientes – “quando você ia aos cajus, eu já voltava com as castanhas assadas”. Virou também recado reto ao vacilão que resolve brigar de bobeira: “ei, vai tomar caju!”. E segue o bloco! Que contorna a praça e abraça o cajueiro central, debruçado na fuzarca tipo anfitrião namorador. Rostinhos colados à malemolência do cancioneiro, o fim do baile traz o beijo da morena tropicana, vejam só. Pele macia, saliva doce, sim, vou lhe desfrutar. “Ô, iô, iô, iô…”.Geleia geral
Natural que a geleia geral de sabores acima tenha, de fato, a alma da Tropicália, e aí pensamos outra vez no poeta: “existirmos a que será que se destina?”. A dúvida existencialista diante da ambivalência do fruto-não-fruta parece extrato nosso chupado de canudinho com aquele barulhinho sacana. Ora, fundamentalmente, existimos a partir da cultura popular e da riqueza exuberante sobre a terra fértil, inda que descuidadas. Eis que o Brasilzão mira a água cristalina do Atlântico e lá está peladão e sem vergonha: é o próprio caju jamais proibido. Travesso no trato, travoso um tanto, “totoso” no total.
Que mistério possui o torrão continental que goza flora pujante como fogos de artifício, e se entorpece da energia do povo na loucura de ser? Salada mista ardente de gritos ambulantes que vendem e consomem fertilidade, é mascate de prazeres até o talo. A alquimia desengonçada do rapaz metido a gato-mestre na barraca de caipirinha: “açúcar, dotô?”. Para esbanjar vida cajuína mergulhada em delirante cortejo made in sol e mar, desfile n’areia, curvas de sereia, sumo e pegada.
Um viva ao paraíso tropical que tudo dá e ao estado de festa indomável na relação entre gentes e chão – o melhor caju do pé de Brasil. Ou seria o melhor Brasil do velho cajueiro?
Alegria gaiteira, convenhamos, já muito experimentada no terreiro fervido dos independentes. Basta “olharmo-nos intacta retina”.
Na cabeça, uma estrela. No corpo suave, o rebolado passista e a pulsação do tambor. Que tal a deliciosa carne de carnaval, o salivar permitido, lamber os beiços longe de qualquer pingo de culpa?
Cá estou, “cajuinamente”, servida de bandeja com a dose de feitiço que me fez banquete desejado desde moça.
Vai, batida mais quente, e vê se leva o aroma do sonhado reencontro comigo mesma: sou dádiva que se alastra igual caju. Sou o fruto mais doce e sexy da capital da folia. Sou quem morde o seu coração…
Títulos da Escola
2017
Campeã
1991
Campeã
1985
Campeã
1996
Campeã
1990
Campeã
1979
Campeã
Ficha Técnica
- Fundação: 10/11/1955
- Cores: Verde e Branco
- Presidente: Flávio da Silva Santos
- Quadra: Av. Brasil, 31.146 – Realengo – Rio de Janeiro, RJ – CEP 21725-001
- Ensaios:–
- Barracão:Cidade do Samba (Barracão nº 10) – Rua Rivadávia Correa, nº 60 – Gamboa – CEP: 20.220-290
A História da Mocidade
Em 1956, apresentou o enredo “Castro Alves”, novamente num desfile local. Em 1957, na praça onze, participou pela primeira vez do desfile oficial no Rio de Janeiro, com o enredo “O Baile das Rosas” conquistando o 5° lugar no grupo de acesso. Em 1958 foi campeã do grupo de acesso com o enredo “Apoteose ao Samba”, mas o que realmente marcou esse carnaval foi que nele foi realizado, pela primeira vez sob o comando de Mestre André, a célebre “paradinha da bateria” em frente à comissão julgadora.
O povo então foi ao delírio, mais tarde, a acompanhar a tal “bossa” com o grito de “Olé”. Durante este período, a Mocidade era conhecida como “uma bateria que carregava a escola nas costas”, pois a bateria era mais conhecida do que a própria escola, só alguns anos depois teve condições de competir com as grandes da época (Portela, Mangueira, Salgueiro, e Império Serrano). A partir da “paradinha” feita por Mestre André, a “paradinha” foi aderida anos depois pelas outras escolas de samba, e hoje em dia todas as baterias das escolas de samba do Rio de Janeiro e do Brasil a fazem.
No ano de 1974, com o carnavalesco Arlindo Rodrigues, apresentou o enredo “A festa do Divino”, tirando um 5° lugar. Mas neste ano ela poderia ter ganhado o campeonato, se não tirasse uma nota 4 em fantasia – o que foi considerado um escândalo, na época, visto que Arlindo era conhecido e consagrado pelo bom gosto e requinte nas fantasias. A campeã Salgueiro teve apenas 4 pontos a mais que a Mocidade, ou seja, um simples 8 em fantasias daria o título à Padre Miguel, visto que no quesito de desempate, bateria, o Salgueiro tinha 9 e a Mocidade 10.
Desde então, a escola deixava de ser conhecida apenas por sua bateria, para impor-se como grande escola de samba. Em 1975, a Mocidade vence pela primeira vez as “quatro grandes”, num desfile realizado em outubro durante o congresso da ASTA – American Society of Travel Agents, no Rio de Janeiro, em que as escolas do grupo principal realizaram um desfile competitivo, a Mocidade foi campeã.
Em 1976, por ironia, a Mocidade empatou em segundo lugar, com a Mangueira, e perdeu o desempate por ter um ponto a menos na nota da tão famosa bateria nota 10. Em 1979, ainda com Arlindo Rodrigues, a Mocidade conquista o seu primeiro campeonato com “O Descobrimento do Brasil”. No ano seguinte, assumiu o carnaval Fernando Pinto, produzindo desfiles considerados pela crítica como excepcionais, projetando-se assim como um dos mais criativos e inventivos carnavalescos já conhecidos.
No primeiro ano de Fernando Pinto na Mocidade, em 1980, a escola conquistou um segundo lugar com o enredo “Tropicália Maravilha”. Em 1983, a Mocidade recebe o Estandarte de Ouro de melhor comunicação com o público com o enredo “Como era verde o meu Xingu”. Fernando permaneceu na escola até 1987, ano de sua morte, e fez grandes carnavais na Mocidade na década de 1980: além de “Tupinicópolis”, deu à escola o título de 1985, com “Ziriguidum 2001”. Nesse carnaval, a Mocidade entraria na Avenida com um enredo futurista, projetando o carnaval do próximo século.